terça-feira, 9 de julho de 2013

Vespas e bestas (crónica publicada no Novo Jornal*)

Um perito em entomologia (ciência que estuda os insectos e a sua relação com o homem e o meio ambiente) destruiu esta semana um dos maiores ninhos de vespas gigantes do mundo.
Jonathan Simkins foi chamado pelos proprietários do terreno onde as vespas fizeram morada, no estado da Flórida, e ficou impressionado. “Este ninho de vespas gigantesco fará com que não queiras voltar a sair nunca”, escreveu o especialista, na sua conta no Twitter.
O entomologista, que é dono de uma empresa de exterminação de insectos, classificou o ninho como pré-histórico”, situando-o na “época dos dinossauros”, e calculou que teria milhões de vespas.
A dimensão do ninho, de dois metros de altura e meio de largura, impressionou o especialista, mas no plano metafórico o que não falta pelo globo são ninhos de vespas, algumas delas gigantescas e mortíferas, como a espécie em apreço.
Uma das mais resistentes e dinossáuricas viu o seu ninho ser destruído esta semana, depois de várias tentativas feitas com resultados efémeros.
Silvio Berlusconi foi condenado terça-feira por um tribunal de Milão, no âmbito do caso «Rubygate», que envolve a bailarina marroquina Karima El Mahroug. O ex-primeiro ministro viu ser-lhe aplicada uma pena de sete anos de prisão por abuso de poder e prostituição com uma menor e só não baixou aos calabouços porque o recurso permitiu-lhe manter-se em liberdade.
Esta não é a primeira condenação de Berlusconi – o ex-governante acumula casos judiciais – mas tem o condão de o afastar definitivamente da política, dispensando os italianos de conviverem com a sua boçalidade. E significa uma machadada nas suas pretensões de vir a ser Presidente de Itália. É que, a partir do momento em que a decisão da Juíza Giulia Turri se torne definitiva, Berlusconi fica impedido de exercer qualquer mandato público.
O ex-primeiro ministro italiano bem pode estrebuchar, dizer que vai “resistir à perseguição” e classificar o veredito de “violento”, mas a sua declaração de inocência não apaga o passado pessoal e político desonroso, que tem escondido graças à sua hegemonia empresarial no ramo dos media.
No mundo dos media, não escasseiam vespas (com Robert Murdoch, que criou um império para manipular o poder político à escala quase planetária, à cabeça), que, não sendo mortíferas, são contraindicadas a quem preserva o bom senso.
Na Austrália – onde há poucos meses uma brincadeira de dois locutores provocou o suicídio de uma enfermeira britânica, de origem indiana – um grupo de apresentadores aproveitou a vaga de manifestações no Brasil para ocupar espaço em antena, no programa de televisão «Today Show».
A conversa derivou para o futebol e uma das estrelas televisivas tratou de discorrer sobre expressões utilizadas no desporto rei no Brasil, com direito a tradução em simultâneo. Um apresentador masculino do painel saltou um “do caralho…” que, segundo ele, quer dizer “um esforço extraordinário”, insistindo na expressão, enquanto os outros riam. E disparou palavras soltas como “legal” e “chata”, que são usadas no Brasil, onde se fala “espanhol”, informavam uns, “italiano”, diziam outros.
Nesta confusão geográfica e linguística, passaram-se largos minutos, até que, alertado por um telespectador, o apresentador que libertou o palavrão pediu desculpas porque o que tinham acabado de dizer era uma grande asneira. O grupo lá informou a audiência que, afinal, no Brasil fala-se português, expondo publicamente a sua ignorância e falta de profissionalismo.
Bem pior, é certo, foi o que aconteceu na Índia, país fustigado pelas cheias. O repórter de uma cadeia de televisão fez um directo em Uttarakhand, uma das zonas mais afectadas, e para não molhar as peúgas, pôs-se aos ombros de uma das vítimas.
Narayan Pargaien lá foi reportando a situação, encavalitado num homem de compleição magra e aspecto frágil, que andava por entre a água lamacenta enquanto decorria o directo. O vídeo tornou-se viral e, num ápice, a estrela de televisão viu choverem sobre si acusações de falta de profissionalismo e desrespeito pelos direitos humanos.
Por mais que diga que fez o que fez porque o homem insistiu para participar no directo, porque “nunca tinha conhecido ninguém tão importante”, Pargaien não pode esquecer que um homem não é uma mula e um jornalista não está acima dos que fazem as histórias que conta. Senão, é ele quem se transforma em besta.
*Publicada na edição de 28 de Junho de 2013

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