Na semana
que antecedeu a atribuição dos Prémios Nobel, o biólogo e jornalista John
Bohannon pôs em causa a seriedade da maior parte das publicações científicas de
acesso grátis, que estão dispostas a publicar trabalhos sem rigor científico ou
metodologia consistente a troco de dinheiro. Do universo de 304 revistas e
jornais científicos contactado pelo jornalista da Universidade de Harvard, 157
aceitaram publicar o trabalho, apresentado como tendo sido feito por Ocorrafoo
Cobange, do Instituto de Medicina Wassee, em Asmara, capital da Eritreia.
Uma das revistas que “caiu”
foi o Journal of Natural Pharmaceuticals, da editora Medknow, com sede na Índia,
e que detém mais de 270 jornais científicos de acesso aberto. Além dessa,
títulos de editoras gigantes, como a «Elsevier», de Amesterdão, na Holanda, e a
«Sage», de Nova Iorque, também tropeçaram no embuste.
Curiosamente, a única que
chamou a atenção para problemas éticos do texto foi a «Plos One», da Biblioteca
Pública de Ciência dos EUA, jornal que já foi criticado por supostamente ter
pouca qualidade na revisão feitas pelos pares.
“Aceitar é a norma, não a
excepção”, afirmou o cientista, que lançou esta armadilha para testar a
fiabilidade das revistas de acesso grátis que, ao contrário da «Science» e
«Nature» - que vivem das assinaturas, são financiadas pelos autores dos estudos
que publicam.
“Os resultados desta
golpada revelam os contornos de um Oeste selvagem emergente nas publicações
académicas”, conclui Bohannon. A Índia surge em primeiro lugar em número de
revistas “apanhadas”, mas os EUA aparecem logo a seguir, o que atesta estar-se
perante um fenómeno global, que nem a Universidade de Kobe, no Japão, deixa de
fora.
O mercado dos estudos
científicos é prolífero e profícuo, como demonstram os inúmeros trabalhos que
todos os anos são divulgados.
Há estudos para todos os
gostos e alguns são de utilidade duvidosa. Cito, como exemplo, o trabalho
desenvolvido por três cientistas da Universidade de Emory, em Atlanta, nos EUA,
que conclui que indivíduos com testículos menores tendem a colaborar mais em
tarefas, como a troca das fraldas.
O estudo, divulgado em
Setembro na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, sugere que
a aptidão de um pai para cuidar dos filhos está associada ao tamanho dos
testículos. Conclusão que escapa ao entendimento de qualquer comum mortal.
No plano da utilidade há
trabalhos que desafiam a imaginação: cientistas do Canadá concluem que há uma
espécie de peixe que comunica entre si, através da flatulência (gases via
ânus); o matemático russo Rouslan Krechetnikov investigou um método para não
derrubar café de uma chávena; e matemáticos britânicos encontraram a fórmula
para decorar a árvore de Natal perfeita (para encontrar o número ideal de bolas, deve-se extrair a raiz quadrada
de 17, dividir o resultado por 20 e multiplicar pela altura da árvore).
A futilidade de muitos estudos levou a revista
humorística «Annals of Improbable Research», em colaboração com a Universidade
de Harvard, a lançar, em 1991, os Prémios IgNobel, e que, em 2012, teve como
grande vencedor o artigo «Rostos e rabos: a percepção do sexo pelos
chimpanzés», resultado do estudo de um primatólogo holandês. Frans de Waal,
juntamente com a colega Jennifer Pokorny, da Universidade da Califórnia,
venceram o IgNobel de Anatomia por “terem descoberto que os chimpanzés podem
identificar individualmente outros chimpanzés a partir de fotografias dos seus
posteriores”, como se podia ler no comunicado.
A importância dos IgNobel mede-se por dois
outros prémios atribuídos em 2012, nas categorias de psicologia e neurociência:
No primeiro caso, a autora chega à conclusão que virar a cabeça para a esquerda
faz a Torre Eiffel parecer menor; e o segundo demonstra que neurocientistas, usando instrumentos complicados e
estatísticas simples, podem ver a actividade cerebral significativa em qualquer
lugar – mesmo num salmão morto”.
Como se infere por estes
exemplos, os caminhos da ciência são, muitas vezes, insondáveis. Mas lá que são
úteis, são: fazem-nos rir.
*Publicada no dia 11 de Outubro de 2013
*Publicada no dia 11 de Outubro de 2013
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