Os americanos levam muito a sério os escândalos sexuais, ao contrário do que tentaram fazer crer os franceses quando induziram a tese de que a detenção de Strauss Kahn era resultado de uma conspiração contra o ex-director do FMI - que o diga Bill Clinton, que esteve quase a perder o mandato de Presidente por se ter envolvido com uma estagiária da Casa Branca.
E em matéria de alcova há que manter a distância necessária para não transvasar para o leito informações de Estado e não quebrar o sigilo profissional, essencial nalguns cargos.
Há mais de uma década que os EUA não viviam um escândalo sexual de tamanha dimensão, depois do alvoroço em torno do envolvimento de Bill Clinton com Mónica Lewinsky, que sujeitou o ex-Presidente a um pedido de impeachment, o segundo na história americana.
Clinton conseguiu escapar à demissão, mantendo-se no cargo, mas qualquer que seja o desfecho da investigação desencadeada pelo FBI à relação de Petraeus com a sua biógrafa, Paula Broadwell, ele não impede a queda de um herói nacional, a quem Robert Gates, à época chefe do Pentágono, atribuiu resultados no Iraque “próximos de um milagre”.
A descoberta de um triângulo amoroso em torno da figura de Petraeus “matou” a carreira do general de quatro estrelas, que “redefiniu o conceito de guerra”, segundo Bob Woodward, o jornalista que, com o seu colega do Washington Post, Carl Bernstein, desvendou o escândalo Watergate, que forçou (Richard) Nixon a renunciar à presidência para não enfrentar um pedido de impeachment. E deixou cair em desgraça o homem, cuja nomeação para dirigir a agência de espionagem americana (CIA), há um ano, passou unanimemente num dos raros momentos de consenso no Senado.
Ou seja, uma carreira militar brilhante derrubada pelo envolvimento extraconjugal com duas mulheres e que foi tornada público por ameaças de uma das amantes, Paula Broawell, a outra mulher com quem o general se envolvera, a socialite Jill Kelley, que pediu a um amigo do FBI para investigar os e-mails ameaçadores que recebia, desencadeando o desfiar de uma meada sem fim à vista.
Tal como Strauss Kahn viu comprometida a sua candidatura à Presidência da República francesa, também Petraeus viu diluírem-se as suas aspirações presidenciais. O nome do general de quatro estrelas, que há uma semana se viu obrigado a apresentar a demissão da direcção da CIA face à eminência do escândalo, fazia parte da lista de possíveis candidatos republicanos às presidenciais de 2016.
De nada valem os apelos de contenção do Presidente Obama, quando questionado na primeira conferência de imprensa dos últimos oito meses, perante a inexistência de provas de que tenha sido revelada informação classificada ou que possa ter impacto na segurança nacional.
A curiosidade da opinião pública está aguçada e, tal como já demonstraram em anteriores situações, os americanos não estão dispostos a suavizar a desilusão por perderem mais um herói público derrotado por vícios privados.
Como nota Bob Woodward, no seu livro «Obama’s Wars», talvez nenhum general americano, depois de Eisenhower no fim da Segunda Guerra tenha sido alvo de tanta admiração como Petraeus. Ele concluiu o doutoramento em Princeton, uma das universidades de elite, em metade do tempo; quase morreu com uma bala no peito e teve uma recuperação excepcional; faltou ao funeral do pai, em 2008, para supervisionar a guerra no Iraque, onde liderou uma estratégia que produziu uma viragem no terreno, permitindo estabilizar o país e reduzir drasticamente a violência. Além disso, era casado há 38 anos com a filha de um superintendente da academia militar, a quem se referia frequentemente nos seus discursos como sendo “maravilhosa”.
Os estilhaços desta bomba, que armadilhou o ambiente político em Washington, onde o general era consensualmente admirado, não apanharam apenas as duas amantes de Petraeus (Paula Broadwell foi sujeita a buscas na sua casa, de onde o FBI levou 20 a 30 mil documentos para analisar se contêm informação confidencial) e a mulher. Na trajectória dos fragmentos está também o general John Allen que viu suspensa a sua nomeação como novo comandante da NATO. Allen trocou e-mails “namoradeiros” com Jill Kelley, a amante de Petraeus ameaçada por Paula Broadwell (major do Exército na Reserva) e o FBI está a investigar o seu envolvimento em todo este caso.
Ainda vai longe o fim desta trama. Mas é certo que um dia fará parte de uma produção de Hollywood. É que não há argumento ficcional que tão bem retrate como um jogo de saias derruba o mais firme e duro dos homens.
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