terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Pelo pão... (crónica publicada no Novo Jornal)

Um electricista romeno do canal de televisão estatal atirou-se, na antevéspera do Natal, das galerias do Parlamento em Bucareste para protestar contra as medidas de austeridade do governo.
Adrian Sobaru, que está livre de perigo, escolheu o momento em que o primeiro-ministro discursava para se atirar de uma altura de sete metros, gritando “liberdade”. Durante a queda, o homem, na casa dos 40 anos, soltou ainda uma frase que explica o seu acto: “Vocês têm o pão dos nossos filhos”.
As imagens da queda, que circularam por todo o mundo, mostraram, para além do gesto de desespero de Adrian, várias expressões de incredulidade e desorientação dos políticos que debatiam no Parlamento uma moção de censura ao governo do primeiro-ministro Emil Boc.
A mesma desorientação que evidenciou a maior parte dos políticos em todo o mundo, durante o ano de 2010. Na Europa, por causa da crise que se abateu sobre as contas públicas de vários países, no rasto da crise financeira provocada pela falência dos grandes bancos americanos. Nos EUA, porque a administração Obama não consegue estancar o desemprego e criar postos de trabalho em número suficiente para tirar o país da grave crise económica em que caiu, após o colapso do sistema financeiro.
O acto de Adrian Sobaru é uma impressionante metáfora do desespero que se abateu sobre cidadãos em todo o mundo que, por causa da especulação e do (des)governo dos líderes dos seus países, se vêem, de repente, privados de direitos que haviam adquirido em anos de trabalho.
Após pressões do Fundo Monetário Internacional, da União Europeia e do Banco Mundial, o governo romeno reduziu os salários dos funcionários públicos em 25 por cento, durante o verão, e diminuiu as pensões. Medidas que tiveram um impacto devastador no rendimento familiar de Adrian que no espaço de pouco tempo sofreu um duplo corte: redução no salário e perda de parte do subsídio que recebia por um filho deficiente.
Outra imagem deste ano que chega ao fim tornou-se emblemática. Não por simbolizar algo recorrente, mas por ser rara.
A viúva de um investidor que lucrou muito com o esquema fraudulento de Bernard Madoff entregou 7200 milhões de dólares para serem distribuídos pelas vítimas do especulador norte-americano.
A decisão, anunciada no dia 17 de Dezembro, surge depois de dois anos de uma batalha judicial que as vítimas de Madoff travaram contra Jeffry Picower, um investidor que ao longo de várias décadas ganhou muitos milhões de dólares, confiando o seu dinheiro à gestão de Madoff.
As vítimas alegavam que 5000 milhões de dólares de Picower eram lucros que pertenciam a outros investidores. Jeffry contestou as alegações, dizendo que não tinha conhecimento dos métodos usados por Madoff. Após a sua morte, há cerca de um ano, os responsáveis pela gestão da herança de Picower chegaram a oferecer 2000 milhões de dólares para chegar a um acordo que pusesse fim ao processo. Até que a sua viúva anunciou que ia entregar todo o dinheiro ganho pelo marido em mais-valias com o esquema Madoff. Trata-se de 7200 milhões de dólares, que somados ao valor já arrecadado pelas vítimas e pelas autoridades norte-americanas dá a soma de 9700 milhões de dólares, perto de metade das perdas provocadas por Madoff.
Em comunicado, a viúva de Picower explicou a decisão, argumentando que “o acordo honra aquilo que Jeffry quereria”.
“Estou absolutamente convencida que o meu marido não era de forma alguma cúmplice da fraude de Madoff”, afirmou Barbara Picower, qualificando de “deplorável” o esquema de Ponzi criado por Bernard, que permitia que, durante um período, os investidores que entregavam dinheiro conseguissem obter rentabilidades bastante acima da média do mercado, à custa da entrada sucessiva de novos investidores. Os últimos a investir antes da pirâmide ruir acabaram por perder todo o seu dinheiro.
As boas intenções proclamadas por Barbara são contestadas por especialistas que não acreditam que Jeffry desconhecia o método de fazer engordar o seu dinheiro, uma vez que o marido entregou 619,4 milhões de dólares a Madoff e, ao fim de 20 anos, recebeu 7200 milhões.
Mas o seu gesto é de grande significado e pode servir de exemplo a outros investidores que conseguiram obter lucros e a quem as vítimas estão a tentar convencer a entregar os ganhos para financiar as perdas dos que ficaram sem nada.
Para já, vai devolver a esperança a muitos milhares. E esperança é o que as pessoas mais precisam em 2011 para enfrentar um dos anos que se adivinha mais difícil em muitos paralelos e hemisférios do globo terrestre.

1 comentário:

  1. Sou brasileiro
    Passei aqui lendo. Vim lhe desejar um Tempo Agradável, Harmonioso e com Sabedoria. Nenhuma pessoa indicou-me ou chamou-me aqui. Gostei do que vi e li. Por isso, estou lhe convidando a visitar o meu blog. Muito Simplório por sinal. Mas, dinâmico e autêntico. E se possivel, seguirmos juntos por eles. Estarei lá, muito grato esperando por você. Se tiveres tuiter, e desejar, é só deixar que agente segue.
    Um abraço e fique com DEUS.

    http://josemariacostaescreveu.blogspot.com

    ResponderEliminar