Dois reclusos de uma prisão da capital portuguesa, considerados perigosos, conseguiram fugir de uma carrinha celular, em pleno dia, quando iam ser ouvidos por um juiz.
O incidente ocorreu no estacionamento do Departamento Central de Investigação e Acção Penal de Lisboa. Quando um dos guardas abriu a porta da carrinha foi atingido na cara com gás pimenta. Dois dos três reclusos, detidos por crimes relacionados com tráfico de drogas, conseguiram escapar. Furtaram um automóvel, dispararam alguns tiros e meteram-se em fuga.
Este caso pouco tem de insólito, a não ser nos detalhes, porque fugas de prisioneiros fazem parte da história de qualquer país. O que é verdadeiramente excepcional é a forma como as autoridades portuguesas lidaram com a situação.
A Direcção-Geral dos Serviços Prisionais determinou a abertura de um inquérito, a cargo do Serviço de Auditoria e Inspecção, mas antes mesmo de o procurador ter tempo de analisar os factos, o director-geral do respectivo serviço veio a público dizer que os reclusos conseguiram retirar as algemas porque, pasme-se, as que foram colocadas num dos detidos “tinha uma deficiência”.
Rui Sá Gomes não se ficou por esta explicação lapidar. Entrou em detalhes, de extrema conveniência para a compreensão dos factos.
“Experimentei aquelas algemas e consegui abri-las com simplicidade, pelo que determinei uma vistoria a todas as algemas para saber se há mais naquelas condições”, acrescentou.
Enquanto os portugueses tentavam enquadrar estas preciosas informações, o director-geral dos Serviços Prisionais lá foi explicando detalhes sobre a fragilidade dos grilhões. Rui Sá quase promoveu uma demonstração em directo sobre a forma de retirar as algemas, que - explicou nas declarações subsequentes um elemento policial - são do mesmo tipo das que se encontram nas sex-shop e que são usadas por casais em sessões eróticas.
Não se sabe a utilidade desta informação, a não ser para os que se entregam ao mundo do crime ou aos prazeres da carne, mas que este caso tem algo de pornográfico, lá isso tem.
Por explicar ficou a forma como o gás pimenta foi parar às mãos dos reclusos.
No seguimento das explicações de Rui Sá Gomes, a Associação Sindical dos Profissionais de Polícia veio a terreiro confirmar que as “algemas distribuídas às forças de segurança são relativamente fáceis de abrir” e que “qualquer cidadão curioso” o consegue fazer.
Para evitar futuros problemas, basta que as chefias comprem um tipo de algemas que são muito difíceis de abrir, “são aquelas que têm qualidade”, explicou. Devem ser mais caras, é certo, mas de eficácia comprovada contra brincadeiras, qualquer que seja o cariz.
A penúria nas forças de segurança portuguesas chega ao ponto de haver polícias que têm de “comprar as suas próprias algemas para usar em serviço” por não haver em número suficiente para os agentes e por alguns “não acreditarem no material que é distribuído”, clarifica Paulo Rodrigues.
Estupefacto com esta torrente de informação ficou o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, que estranhou o facto de o director-geral dos Serviços Prisionais se ter transformado num “instrutor de retirar algemas”.
João Palma não esteve com meias medidas, nem com eufemismos, e lamentou haver “situações em Portugal que fogem a todo o bom senso e a toda a razoabilidade”. O mais normal – contrapôs - seria o director-geral das prisões preocupar-se com “as condições em que os guardas prisionais trabalham e as condições em que é feito o transporte dos presos”.
Nesta aventura hollywoodesca não houve mortos, mas podia ter havido. Agora que há ingredientes suficientes para um bom filme, isso há.
O enredo é quase tão bom como aquele que foi protagonizado por agentes da polícia em Chimoio, capital de Manica, no centro de Moçambique. Cinco polícias foram detidos por alugar armas e uniformes a bandidos e envolverem-se em crimes.
Segundo a polícia, um dos agentes em causa envolveu-se no roubo de uma viatura estacionada junto à terceira esquadra em Chimoio, e outro, na companhia de homens que se fizeram passar por polícias, assaltou uma empresa chinesa, com recurso a armas de fogo.
Os outros três agentes detidos, pertencentes à guarda de fronteira, assaltaram um grupo de garimpeiros em Machipanda, na fronteira com o Zimbabwe, tendo roubado grandes quantidades de ouro em bruto e 20 mil meticais (593 dólares americanos).
Estes dois casos, o de Portugal e Moçambique, nada têm de comum. Mas ambos revelam a penúria que grassa nas forças de segurança para insegurança de todos.
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