“Querido Anders Behring Breivik”.
“Tu acreditas que venceste porque mataste os meus amigos e companheiros. Acreditas que destruíste o partido trabalhista e as pessoas que crêem numa sociedade multicultural”.
“Quero que saibas que falhaste. Não vamos responder ao mal com o mal, como gostarias. Vamos combater o mal com o bem. E venceremos”.
“Descreveste-te como um herói, um cavaleiro. Não és um herói. Mas uma coisa é certa: criaste heróis. Em Utoya, nesse dia quente de Julho, conseguiste criar alguns dos maiores heróis que jamais existiram no mundo”.
“Vou-te explicar como funcionou o teu plano. Conseguiste ser o homem mais odiado da Noruega. Muitos estão com raiva de ti; eu, não. Não tenho medo de ti. Não podes alcançar-nos, somos maiores que tu”.
Estes excertos da carta de Ivan Benjamin Oesteboe, uma das vítimas do “monstro” norueguês que, no dia 22 de Julho, fez rebentar um carro bomba, no centro de Oslo, e que numa ilha repleta de jovens que participavam numa iniciativa do Partido Trabalhista disparou contra dezenas de pessoas indefesas, é um testemunho invulgar da tragédia que se abateu sobre a Noruega. Tão invulgar quanto a idade do autor da carta, um adolescente de 16 anos, que perdeu cinco amigos na carnificina.
A carta, que Benjamin enviou a Breivik e que publicou na sua página no facebook, vale mais do que mil discursos políticos contra a violência, o fanatismo e a xenofobia.
É um hino à tolerância, à liberdade, à paz e ao perdão.
É um sinal de maturidade de quem viu e foi enganado pelo demónio, quando o demónio se escondeu atrás de uma farda da polícia para atrair os jovens para o seu plano maquiavélico. “Chamámo-lo, agitando os braços. Estava a tentar acalmar os jovens que o rodeavam e de repente, impassível, deu a volta e começou a disparar contra todos”, recordou Ivan Benjamin.
É um manifesto contra o medo.
Um guia para transformar a fraqueza em força. Seguir em frente. E dar sentido a uma tragédia que não tem qualquer razão que a justifique.
O cenário foi um hospital do Irão. Dois médicos estavam prontos para deitar algumas gotas de ácido nos olhos de Mohavedi e provocar-lhe a cegueira.
A um minuto de executarem a sentença, decretada por um tribunal iraniano, Ameneh Bahami ergueu-se e perdoou ao homem que, em 2004, lhe despejou ácido para a cara, desfigurando-a e provocando-lhe a cegueira.
A mulher, “condenada” por simplesmente recusar um pedido de casamento, renunciou à última hora à aplicação da lei de talião, que condena à utilização do mesmo crime, na lógica do olho por olho, dente por dente.
Enquanto Mohavedi em lágrimas se debruçava, em repetidos agradecimentos à mulher que ele condenara sete anos antes a um destino de escuridão, Ameneh explicou o seu gesto: “Durante sete anos tenho tentado que a sentença qisas (retribuição) seja aplicada, mas hoje decidi perdoá-lo”.
A repercussão que o caso teve na imprensa internacional ajudou-a a renunciar à aplicação da lei da retribuição e deu uma visibilidade invulgar a um crime que se tornou vulgar no Irão.
Durante anos, a jovem iraniana, que hoje vive em Espanha, onde já se submeteu a várias operações para recuperar a forma do rosto, lutou por justiça. Por si, mas também por dezenas de mulheres que todos os anos são vítimas de actos bárbaros, só por se atreverem a expressar a sua vontade. Um direito internacionalmente consagrado.
A Amnistia Internacional manifestou-se contra a decisão de cegar Mohavedi, por constituir um castigo equivalente a um “acto cruel e desumano de tortura”.
A imprensa iraniana amparou a jovem na sua luta, patrocinando com o seu apoio uma campanha contra os ataques com ácido que se tornaram frequentes no Irão
Ameneh foi em frente para recuar no último minuto. “Fi-lo pelo meu país, porque o mundo inteiro estava a observar o que iríamos fazer”
E o mundo viu um gesto magnânime de perdão, inversamente proporcional ao que impulsionou Mohavedi, preso há sete anos e condenado a pagar 150 mil euros de indemnização à jovem para ajudar na sua recuperação.
A imagem daquele homem, com longas vestes brancas e banhado em lágrimas, contrasta com o acto de violência que cometeu contra a mulher amada. O ódio que animou o ataque serviu de combustível para o perdão e, com ele, a melhor condenação ao seu crime.
Benjamin e Ameneh provaram com actos as palavras que guiavam Mahatma Gandhi: O mundo acaba cego se continuar a aplicar a lei do olho por olho, dente por dente.
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