Estas palavras, que abrem a mensagem do Papa Bento XVI para o Dia Mundial das Comunicações Sociais de 2012, fazem cada vez mais sentido na torrente de informação que jorra hoje, mas vem tarde demais para o Presidente da República de Portugal, ele próprio um Católico devoto.
Na sua vida pública, Cavaco Silva tem gerido mal a relação entre a palavra e o silêncio. Por vezes, refugia-se no silêncio quando se esperam palavras do Chefe de Estado; outras interrompe-o com alarde e gera alarmismo e, com frequência, cai no comentário simplório, revelando desdém pelos outros, quer sejam partidos políticos, adversários eleitorais ou simples cidadãos.
Há uma semana, Cavaco Silva levou ao limite o mau uso que faz da palavra e desferiu um tiro certeiro na seriedade que os portugueses lhe reconheciam.
Questionado sobre a recusa do Banco de Portugal em cortar nos subsídios dos seus trabalhadores (quando os restantes funcionários públicos viram as suas subvenções de Natal e férias amputadas), Cavaco respondeu que o que vai receber da Caixa Geral de Aposentações não lhe chega para pagar as despesas.
O Presidente não se ficou por aqui. Levou mais longe a arrogância de autoridade incontestável e fez questão de dizer ao jornalista, com ar de repreensão, que não recebe vencimento como Presidente da República, insistindo nos 1.300 euros por mês que vai receber da Caixa de Aposentações – “não sei se ouviu bem, 1.300 euros por mês”.
Cavaco esqueceu-se, e devia tê-lo feito, de acrescentar que recebe cerca de 10 mil euros (perto de 13 mil dólares) de pensões, para além de 2.900 euros a que tem direito por mês para despesas de representação a que o cargo de Presidente obriga. Não faltou quem refrescasse a sua memória, tornando Cavaco, as suas reformas e os seus bens nos temas dominantes das manchetes e comentários políticos da última semana. Em comum o tom crítico das reacções nunca visto até aqui em relação ao actual Presidente.
Cavaco Silva foi vaiado na cerimónia de abertura da Capital Europeia da Cultura 2012, em Guimarães, uma petição online onde se pede a sua demissão reuniu em poucos dias 23 mil assinaturas e, na terça-feira, a iniciativa “Uma moeda para Cavaco” juntou à porta do Palácio de Belém, a residência oficial do Presidente, mais de duas centenas de pessoas, num protesto simbólico contra as suas declarações.
O protesto, organizado pelo Facebook, não angariou apenas moedas. Juntou pacotes de cereais, leite, pão e arroz. Bens que ficaram à porta de Belém, porque Cavaco Silva deu instruções aos seus assessores que só receberia um documento escrito.
Os esclarecimentos que o Presidente da República prestou, num texto enviado à Agência Lusa três dias depois das declarações iniciais, não foram suficientes para abafar o descontentamento e que o vice-presidente da bancada parlamentar do PSD (o partido de Cavaco), Carlos Abreu Amorim, resumiu num comentário à RTP: “Senti vergonha quando o Presidente disse aquilo. O Presidente falou mais como ex-funcionário do Banco de Portugal do que como Presidente de todos os portugueses. Eu temo, e é uma das minhas preocupações, que Portugal, que tem neste momento um bom governo e um bom primeiro ministro, não tenha um Presidente da República à altura”.
Como disse uma ex-trabalhadora reformada, que protestou em frente ao Palácio de Belém, Cavaco Silva não teve um “comentário infeliz”, como insistem os que lhe são mais próximos. “Compete-lhe cuidar do que diz mais do que qualquer cidadão”.
Num momento em que os portugueses enfrentam grandes dificuldades, o cargo que Cavaco ocupa exige que seja solidário e não demonstre estar acima dos que há um ano o elegeram para um segundo mandato.
Da sua postura depende a forma como os portugueses o vão recordar. E a memória futura da sua passagem pela política sofreu, nos últimos dias, um duro revés.
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