Como líder da Juventude Internacional Socialista, Beatriz teve direito a um espaço nas intervenções. E, quando subiu à tribuna, depressa pôs de parte o discurso que levava escrito e substituiu-o por uma dura crítica à acção dos líderes socialistas em todo o mundo.
Sem temperar as suas palavras com eufemismos, Talegón acusou a Internacional Socialista de não trabalhar para os jovens, de estar ao “serviço das elites”, de “ser burocrática” e de “dançar com o capitalismo”.
“Como se pode liderar uma revolução a partir de um hotel de cinco estrelas em Cascais, chegando em carros de luxo? Podemos dizer aos jovens que os compreendemos, que sentimos a sua dor aqui dentro, no meio deste luxo?”, questionou Beatriz, evidenciando a crescente distância entre os dirigentes e a geração mais jovem, que vive sem emprego, sem esperança e que se manifesta nas ruas.
A intervenção da líder da Juventude Internacional Socialista passou despercebido, no que aos órgãos de comunicação social diz respeito. A difusão das suas palavras deu-se graças às redes sociais. Num ápice, o discurso ecoou por todo o mundo e desencadou uma catadupa de reacções, graças ao Youtube. Só a partir daí ressoou pelos jornais de todo o mundo, embaraçando os líderes daquela organização partidária. As reacções em Espanha foram particularmente violentas, com algumas facções a pedirem a sua demissão e a desencadearem uma campanha de assassinato de carácter.
Acusada de não ter uma vida consistente com o seu discurso e de ganhar um ordenado muito acima das possibilidades de qualquer jovem, Beatriz não se furtou às críticas. Encheu o peito e, nos canais de rádio e televisão espanhóis, desdobrou-se para responder aos seus detractores, deixando claro que aufere um ordenado de 1.500 euros, muito abaixo dos montantes que lhe atribuem.
Talegón não disse nada que já não se soubesse. O que constitui novidade aqui foi ter sido dito por uma líder partidária que, com coragem e de forma desassombrada, pôs os pontos nos is, dando o tom para uma dança em rodopio dos que vêem o seu status quo ameaçado.
Também esta semana, outro tipo de dança mobilizou mulheres em todo o mundo, no dia em que se comemorou o amor. Mais de 200 países aderiram à campanha «One Billion Rising», que tem por base a estatística trágica da ONU, que revela que “mil milhões de mulheres – uma em cada três – serão violadas e agredidas no planeta durante a sua vida.
A ideia partiu da conhecida dramaturga norte-americana Eve Ensler, autora do livro «Os Monólogos da Vagina», depois de ter visitado uma comunidade na República Democrática do Congo, onde as mulheres, altamente vulneráveis à violência, saram as feridas com a dança.
Vi o poder da dança e comecei a pensar o que seria se mil milhões de mulheres, e todos os homens que as amam, dançassem no mesmo dia, em todo o planeta”, explicou a escritora, durante uma teleconferência com jornalistas de todo o mundo.
O objectivo foi juntar no Dia dos Namorados um número igual ou superior de mulheres e homens em todo o mundo e pô-lo a dançar juntos, para combater um flagelo mundial, que envergonha a todos. E aparentemente, a iniciativa teve sucesso. Até em Cabul, capital do Afeganistão, onde não são reconhecidos direitos às mulheres, elas saíram à rua.
Nem de propósito. Nesse mesmo dia, um tribunal português absolveu uma mulher acusada de matar o marido, em Fevereiro de 2011.
O colectivo de juízes do Tribunal de Marco de Canaveses, no norte do país, concluiu que a mulher matou para defender a sua vida e as dos filhos menores do casal, não dando consistência à acusação de homicídio qualificado apresentada pelo Ministério Público.
“Ela temeu pela sua vida e pelos seus filhos. Ela estava nervosa e tomada pelo pânico”, afirmaram os juízes, considerando provado que o homem, alcoolizado com 3,54 gramas por litro e armado com uma pistola, ameaçara a mulher de morte.
A reiterada violência de que a mulher era vítima, serviu para reforçar a convicção de que ficaram preenchidas as condições para se ter verificado “uma situação de legítima defesa putativa”.
A absolvição da homicida não desfaz o crime, mas reforça a ideia que a violência doméstica, qualquer que ela seja, não é sustentável nem admissível e traduz um acto de amor e compaixão de quem tem a missão de julgar.
No dia dos Namorados, altura em que escrevo esta crónica, apetece gritar: “Vamos para a rua dançar?”
*Crónica publicada no dia 15 de Fevereiro de 2013
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