“Pedro, meu filho,
hoje faz 16 anos que desapareceste! Ironicamente é carnaval! As pessoas
divertem-se ou dormem depois de uma noite de folia, é normal. Mas eu não
consigo deixar de pensar em ti… e que hoje é 4 de Março… A ironia da vida, uns
tristes outros contentes!”
Todos os anos, milhões de crianças desaparecem em todo o
mundo. Ninguém sabe ao certo quantas. Não há país que escape a este flagelo.
Nem lei que impeça que o elo entre as crianças e a família se quebre. Umas
fogem do desamor e dos maus tratos, muitas são roubadas e impedidas de
regressar a casa.
Em 2007, a UNICEF estimava em 1,2 milhões o número de
crianças que é anualmente vítima de tráfico humano. Muitas são vendidas como
escravas, outras são postas ao serviço de redes de prostituição, pedofilia, de
mendicidade e há ainda as que são mortas. No rasto de todas elas há uma família
que chora.
“Há tanta coisa para
te dizer, tantas promessas a cumprir que não vão chegar o resto dos meus dias
para as realizar… volta, estamos aqui todos à tua espera… tal como naquele
fatídico dia 4/03/1998… Se não quiseres falar basta um abraço, tu sabes dar tão
bem abraços! E beijos pequeninos… bem sei que estás crescido, mas a mim não
vais negar?!”
Ninguém sabe quantas crianças no mundo desaparecem. Em
África e na Ásia praticamente não há dados. Nos EUA, é comunicado anualmente o
desaparecimento de perto de meio milhão. A maior parte foge de casa. Mas há uma
fatia significativa de raptos, de assassinatos e de menores que as famílias
nunca mais conseguem recuperar. No seio destas há feridas que sangram… sem
parar.
“Tenho tentado tudo
para suportar a tua ausência… tudo mesmo!!! Às vezes digo a mim própria que é
um pesadelo e que vou acordar a qualquer momento e tu estás aqui… depois abro
os olhos e a realidade atordoa-me os sentidos” NÃO ESTÁS! E não posso fazer
nada!!!”
Numa Europa sem fronteiras, o desaparecimento de menores não
é tratado de forma global. Não há um sistema comum, nem uma resposta integrada.
Cada país fala por si e cada um sabe de si. Uma realidade que contrasta com a
facilidade de movimentação no espaço Schengen.
“Sabes, já nem rezo,
olho para o vazio e mentalmente pergunto por ti?! Já nem sei quem sou, ou no
que me tornei!!! Um fardo para uns… uma lunática para outros! Dizem que sou
forte?! Quando eu sou tão frágil… imagina a tua irmã o que tem de suportar?! E
ser a filha mais maravilhosa que alguém poderia ter! Porque é nisso que ela se
tornou Pedro, num ser humano espantoso! Tens de ter orgulho nela!”
Em 1986, sete anos após o rapto de Etan Patz, uma criança de
seis anos de Nova Iorque, o Presidente Ronald Reagan dedicou o dia 25 de Maio a
todas as crianças desaparecidas. A data acabou por ser reconhecida como Dia
Internacional das Crianças Desaparecidas. E as organizações que a ela aderiram
adoptaram como lema a frase «Nunca me esqueças».
“Vês filho, o que
tenho para te dizer não chega uma carta… Como faço para comunicar contigo? A
tua irmã está à distância de um telefonema, basta-me saber que está bem!
Contigo faria igual, só quero que sejam felizes! É pedir muito filho?”
Rui Pedro desapareceu na tarde do dia 4 de Março de 1998, no
norte de Portugal. Tinha 11 anos. Para trás ficou a bicicleta, tombada no chão.
Desde aí, a família trava uma luta incessante para o encontrar. Filomena
tornou-se o símbolo dos que perdem um filho. O seu rosto transporta as marcas
de uma dor que não desaparece. No coração conserva a esperança. É uma esperança
que não esmorece, que a motiva a continuar. E a viver.
“Quando puderes juras
que me respondes? Eu continuo aqui à espera.
Um Abraço do tamanho
do mundo, da tua mãe que te adora e que não sabe o que fazer sem ti?!
PS. Estou a
escrever-te do teu quarto, o pai acabou de entrar, ele trabalha muito, e sente
muito também a tua falta, só não sabemos como te dizer!? Daí a carta, desculpa
se é muito longa, mas juro que se tu vieres eu não te canso! Eu calo-me e
basta-me o teu olhar no meu.
Adoro-te! Mãe.”
*Publicada no dia 7 de Março de 2014
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