Michelle Bachelet tomou posse esta semana como Presidente do
Chile. É um regresso ao cargo que ocupou entre 2006 e 2010. Impedida pela
Constituição chilena de concorrer a mandatos consecutivos, a socialista
regressa ao Palácio de La Moneda, após um interregno de quatro anos, com um
novo compromisso: tornar a educação pública o principal pilar da sua
governação.
Bachelet - que recebeu a faixa presidencial das mãos de
Isabel Allende (filha do antigo presidente Salvador Allende, deposto e
assassinado em 1973), que tomou posse como presidente do Senado - não podia ter
escolhido melhor bandeira para hastear.
A educação é a arma mais eficaz que as pessoas têm ao dispor
para transformarem o seu destino e contrariarem o ciclo da pobreza que condena
muitas famílias a uma vida de miséria. Tornar o seu acesso universal é a melhor
forma de combater a desigualdade e acabar com a discriminação, nomeadamente de
género.
O facto de a Presidente do Chile assumir este compromisso,
ao lado de Isabel Allende – outra figura de proa do actual Estado chileno - tem
um simbolismo especial, neste mês consagrado à Mulher, e mostra que com
educação não há barreiras intransponíveis, a não ser aquelas que são erguidas
pela ignorância, obscurantismo e fanatismo religioso.
A educação é um pilar essencial do desenvolvimento e uma
premissa fundamental da liberdade, mas ainda não está acessível a todos.
A Unesco estima em cerca de 100 milhões o número de
raparigas de países pobres e médios que não sabem ler, nem escrever.
Na abertura da 58ª sessão da Comissão do Estatuto Jurídico e
Social da Mulher, realizada esta semana, a Organização das Nações Unidas para a
Educação, Ciência e Cultura alertou para o “grave desequilíbrio de géneros” de
que padece a educação à escala mundial, escorando-se em dados de 2011 que
indicam que só 60 por cento dos países alcançaram a paridade no ensino básico e
38 por cento no secundário.
Estas percentagens caem para uns desonrosos 20 e 10 por
cento, respectivamente, no caso dos países de baixos rendimentos.
As meninas dos países árabes são as que se encontram em pior
situação. Seguem-se as da Ásia meridional e ocidental e as da África
Subsaariana.
A tendência actual permite acreditar que “só 70 por cento
dos países terá alcançado a paridade no ensino primário, em 2015, e unicamente
56 por cento o terá conseguido no segundo ciclo do ensino secundário”, refere a
organização das Nações Unidas.
Um relatório concluído entre 2013 e 2014 refere que 175
milhões de jovens de países em desenvolvimento não sabem ler. Sessenta e um por
cento deste universo são mulheres, o que as relega para segundo plano.
“É simplesmente intolerável que as meninas fiquem para trás.
Para as meninas pobres, a educação é uma das vias mais poderosas para um futuro
melhor, que as ajudará a escapar ao círculo vicioso da pobreza”, afirma a
directora-geral da Unesco, Irina Bokova, sublinhando a necessidade de consagrar
a promoção da igualdade, especialmente no âmbito educativo, como objectivo
fulcral da nova agenda do desenvolvimento.
Sem terem esta preocupação no centro das suas prioridades,
os países estarão a consentir a discriminação de género. Cabendo ao homem o
papel tradicional de sustento, as famílias pobres privilegiam o acesso à
educação aos rapazes e, só em último plano, às meninas.
Este guião perdura em muitas sociedades, por incúria, mas
noutras, sobretudo nos países árabes, tem o propósito firme de cercear o papel
das mulheres, a quem não são reconhecidos, nos casos mais extremos, quaisquer
direitos. O ataque dos talibans às escolas femininas, no Paquistão - que
trouxeram Malala Yousafzai para o primeiro plano da cena internacional, após
ter sido baleada, no regresso da escola – é a face mais visível deste fenómeno.
Dar educação é dar poder às mulheres e os talibans querem a todo o custo
impedir que ele chegue às mãos delas.
A educação pública e gratuita para todos é o principal
investimento dos Estados. Não gera lucros a curto prazo, nem dividendos
imediatos, mas tem um efeito duradouro e ilimitado. Não reconhece-lo é um sinal
de ignorância ou então de má-fé.
*Publicada no dia 14 de Março de 2014
Sem comentários:
Enviar um comentário