domingo, 4 de julho de 2010

No dia de Cabo Verde



Cabo Verde comemora amanhã, 5 de Julho, 35 anos de independência.
Altura ideal para evocar aquela que é para mim a voz de Cabo Verde: Ildo Lobo.
Ouvi-o pela primeira vez em Outubro de 2004.
Impressionou-me aquela voz;
impressionou-me a postura ;
impressionaram-me as mornas que saíam daquele corpo vestido de negro (era assim que ele se apresentava em palco: roupa preta; a mão direita no bolso das calças).
Nos dias que se seguiram devorei tudo o que dizia respeito a Ildo Lobo.
Li artigos sobre ele e os tubarões (grupo que o lançou como cantor e que marcou a música caboverdiana após a independência).
Devorei entrevistas publicadas nos jornais.
E ouvi os dois discos que tinha editado.
Passado uma semana, Ildo Lobo morreu.
Morreu nas vésperas de partir para Lisboa, a um mês e cinco dias de completar 51 anos de vida.
Preparava o lançamento de «Incondicional, o terceiro disco de uma trilogia que o prendia ao produtor de Cesária Évora.
Mas ao contrário de Cesária, Ildo não chegou a conhecer a consagração internacional.
O seu nome foi ofuscado pela projecção da divã dos pés descalços.
Ficou diminuído pela insularidade.
A sua voz não foi onde devia ter ido.
Ildo Lobo sabia-o.
Sentia-o.
Lia-se nas entrevistas que deu.
Nem sempre sentiu o quanto gostavam dele.
Nem sempre os caboverdianos o manifestaram, como fizeram nesse 20 de Outubro de 2004.
«Pamodi ?» (porquê?), a pergunta preencheu uma enorme faixa que dezenas de crianças envergaram no seu funeral.
A mesma pergunta que Ildo Lobo repetiu na música «Alegria» do seu último disco.
Um hino às crianças contra a exploração, a maldade, a injustiça.
Os mesmos males que o fizeram juntar a sua voz a favor da luta pela independência de Timor Leste, substituindo a letra da música «Djonsinho Cabral», da autoria de Rui Machado (que fez a adaptação), pelo manifesto «Ask Xanana», gravado em 1996.
(Ficam aqui as duas versões.)
A imagem de Ildo Lobo a cantar nunca saiu da minha cabeça.
Ouço-o com alegria.
Cumpro à risca as orientações que deixou na música «Nha Testamento» (Meu Testamento)
"Na despedida não quero amargura
Nem saudade de uma vida sonhada
Quero a alegria de uma vida vivida
Embalada nas ondas do destino"
A sua voz acompanha-me.
Até hoje.
E amanhã.
Dia em que comemoro com os caboverdianos a sua independência.

PS. Como havia problemas nos vídeos «Ask Xanana» e «Djonsinho Cabral», que impossibilitava que alguns utilizadores os abrissem, substitui-os pelo tema «Porton di nos ilha», um dos hinos dos Tubarões. É para ouvir devagarinho e, para quem não souber crioulo, tentar decifrar a letra. Afinal, o crioulo não é muito diferente do português.

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