Spozhmai tem 10 anos e uma história que nada tem a ver com a
sua idade.
A menina afegã está desde domingo numa esquadra de polícia no
sul do país, depois de o irmão, um chefe local taliban, ter tentado convencê-la
a usar um colete suicida para se fazer explodir num checkpoint (posto de
controlo).
O pai de Spozhmai já foi preso e as autoridades continuam à
procura do irmão, embora os taliban, através do seu porta-voz, Qari Yousef
Ahamdi, recusem qualquer responsabilidade, alegando que a história é propaganda
do Governo.
O regresso a casa pode significar uma sentença de morte,
apesar de o Presidente do Afeganistão Hamid Karzai ter pedido ao Ministério do
Interior que obtenha garantias de que Spozhmai pode regressar, porque,
considera ele, o lugar da criança é junto da família.
Em teoria é assim que deve ser. Mas, num país estilhaçado
por mais de três décadas de guerra, não há alicerces que garantam a
sustentabilidade da família enquanto garante de segurança e integridade.
O fanatismo religioso transforma a fé em ódio, numa cruzada
que derruba qualquer tipo de valores. E o recurso a crianças da própria família
como arsenal de guerra é visto como a face derradeira da desumanização, em nome
de Deus ou de um ser supremo.
“Obrigar crianças a cometer ataques suicidas contraria as
instruções do islão sagrado e os valores da cultura afegã”, clamou o Presidente
Karzai. A história recente do país desmente-o. Apesar de serem raros, há casos
documentados, como revelou à Associated Press Heather Barr, a principal
investigadora da Human Rights Watch, no Afeganistão.
Em 2011, na província de Uruzgan, no centro do país, uma
menina, de oito anos, morreu num checkpoint, quando a mala de explosivos que os
taliban a tinham mandado carregar rebentou. No Iraque, já eram frequentes os
relatos de ataques suicidas com adolescentes.
Em nome do islão, o Afeganistão e o Iraque estão mergulhados
em caos desde que o Presidente George W. Bush ordenou intervenções militares
nos dois países, na sequência dos atentados de 11 de Setembro de 2001, nos EUA.
As intervenções no Afeganistão e no Iraque não derrubaram a
Al-Qaeda, nem travaram os talibans, antes pelo contrário inflamaram o ódio,
criando ramificações difíceis de conter, que alastram a outros países.
Os jihadistas do Estado Islâmico do Iraque e Levante (ISIL,
na sigla inglesa) declararam esta semana “guerra total” aos antigos aliados
islamistas que combatem na Síria e ao Governo do Iraque, ambos controlados por
xiitas.
O aviso é claro e contempla recompensas para quem ajudar a
aniquilar inimigos. “Nenhum de vocês sobreviverá, faremos de vocês um exemplo
para todos os que pensarem seguir o mesmo caminho”, afirmou o porta-voz do
ISIL, Abou Mohammed al-Adnani.
A guerra trava-se entre várias facções islamistas. Apenas
escapa à declaração a filial síria da Al-Qaeda, a Frente al-Nusra. Na Síria é,
de resto, proposto um cessar-fogo entre os islamistas de forma a que os vários
grupos se possam concentrar na luta contra Bashar al-Assad, o que revela bem a
natureza da guerra na Síria: o ódio entre várias facções do islão pelo controlo
do poder.
O fervor religioso também fez mais baixas entre os cristãos
no ano que passou. O número de cristãos mortos quase duplicou. Só na Síria morreram
mais fiéis do que em todo o ano anterior, revela a Open Doors (Portas Abertas),
que documentou 2.123 cristãos mortos em 2013, em todo o mundo, e estima em 100
milhões o universo de fiéis perseguidos. Outras organizações apontam mais de
oito mil mortos.
Calculados em 2,2 mil milhões em todo o mundo, cerca de 32% da
população mundial, os cristãos enfrentam restrições à liberdade religiosa e
hostilidade em 111 países, de acordo com a Pew Forum on Religion and Public
Life, organização sediada nos EUA que estima em 99 o número de países onde há
limitações à fé islâmica.
Curiosamente, a Coreia do Norte lidera a lista dos 50 países
mais perigosos para os cristãos. Ali apenas é permitida a adoração a um deus: o
terreno Presidente Kim Jong-un. E também em nome dele se mata
indiscriminadamente.
Publicada no dia 10 de Janeiro de 2014
Sem comentários:
Enviar um comentário